quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Há duzentos anos que o Rio de Janeiro sofre com políticos Corruptos, roubo, violência e assassinatos. A metade da população era de escravos hoje a metade é de favelados e um povo ignorante por natureza, esta historia relatada neste livro mostra que não houve melhora desde 1808.

O CHEFE DA POLÍCIA

"As pessoas fazem a História, mas raramente se dão conta do que estão fazendo."
Christopher Lee  



 Uma bomba populacional abalou o Rio de Janeiro nos treze anos em que a corte
Portuguesa esteve no Brasil. O número de habitantes, que era de 60.000 em 1808, tinha
Dobrado em 1821. Só São Paulo, transformada na maior metrópole da América Latina na
Fase da industrialização, na primeira metade do século XX, veria um crescimento tão acelerado.
No caso do Rio de Janeiro, havia um agravante: metade da população era
Escrava. Pode-se imaginar o que foi isso numa cidade que já em 1808 não tinha espaço,
Infra-estrutura nem serviços para receber os novos moradores que chegavam de Lisboa.
A criminalidade atingiu índices altíssimos. Roubos e assassinatos aconteciam a
Todo momento. No porto, navios eram alvos de pirataria. Gangues de arruaceiros
Percorriam as ruas atacando as pessoas a golpes de faca e estilete. Oficialmente
Proibidos, a prostituição e o jogo eram praticados à luz do dia. "Nesta cidade e seus
Subúrbios têm sido muito insultados pelos ladrões", relata o arquivista real Luiz
Joaquim do Santo Marrocos numa das cartas ao pai, que ficara em Lisboa. "Em cinco
Dias, contaram-se em pequeno circuito 22 assassinatos, e numa noite defronte à minha
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Porta fez um ladrão duas mortes e feriu um terceiro gravemente." Marrocos reclamava
Que havia negros e pobres em demasia nas ruas do Rio de Janeiro e que a maioria se
Vestia de forma indecorosa.
A tarefa de colocar alguma ordem no caos foi confiada por Dom João ao advogado
Paulo Fernandes Viana. Desembargador e ouvidor da corte, nascido no Rio de Janeiro e
Formado pela Universidade de Coimbra, Viana foi nomeado intendente geral da polícia
Pelo alvará de 10 de maio de 1808, cargo que ocupou até 1821, o ano de sua morte.
Tinha funções equivalentes ao que seria hoje a soma de um prefeito com um secretário
De Segurança Pública. Mais do que isso, era "um agente civilizador" dos costumes no Rio
De Janeiro. Cabia a ele transformar a vila colonial, provinciana, inculta, suja e perigosa
Em algo mais parecido com uma capital européia, digna de sediar a monarquia
Portuguesa. Sua missão incluía aterrar pântanos, organizar o abastecimento de água e
Comida e a coleta de lixo e esgoto, calçar e iluminar as ruas usando lampiões a óleo de
Baleia, construir estradas, pontes, aquedutos, fontes, passeios e praças públicas. Ficou
Também sob sua responsabilidade policiar as ruas, expedir passaportes, vigiar os
Estrangeiros, fiscalizar as condições sanitárias dos depósitos de escravos e providenciar
Moradia para os novos habitantes que a cidade recebeu com a chegada da corte.
Viana era um dos mais influentes auxiliares do príncipe regente, com quem tinha
Audiências a cada dois dias. Afirmava ser "um dever da polícia trazer o povo entretido e
Promover o amor e respeito dos vassalos para com o soberano e sua real dinastia".
Munido de superpoderes, ele se metia em praticamente tudo. Brigas de família e vizinhos,
Confusões envolvendo escravos e senhores, organização de festas e espetáculos
Públicos, distribuição de livros e jornais estrangeiros, o comportamento das pessoas
Dentro e fora de casa - nada escapava de seu crivo. Em ofício ao comandante da polícia,
Em janeiro de 1816. Mandava matar os cães vadios, "que já se fazem insuportáveis nesta
Cidade e de cuja tolerância podem nesta ardente estação seguirem-se males, além dos
Ordinários que já estão causando de investirem, morderem, e esfarraparem o povo". Em
Outro ofício ordenava à guarda militar reprimir "assobios, gritos, pateadas, e outros
Comportamentos e modos incivis que o povo pratica" durante os espetáculos de teatro.
Uma das primeiras tarefas de Viana no seu novo e ingrato papel de agente
Civilizador do Rio de Janeiro foi mudar a própria arquitetura colonial da cidade. Coube a
Ele executar a ordem de Dom João que determinava a substituição das austeras rótulas
De madeira nas janelas das casas por vidraças. "Sendo agora uma corte, o Rio de
Janeiro precisa de propriedades de outra natureza, que enobreçam e embelezem a
Cidade", registrou num ofício. A medida foi tomada por razões estéticas, mas também por
Segurança: temia-se que as janelas escondidas atrás das treliças fossem usadas em
Emboscadas contra a corte portuguesa.
A cruzada para mudar os costumes encontrava um obstáculo na presença maciça
Dos escravos nas ruas da cidade. Era uma fonte permanente de tensão social,
Especialmente depois que a revolta de negros cativos na Ilha de São Domingos tinha
Resultado num banho de sangue entre os colonos brancos - a mesma ilha abriga hoje a
República Dominicana e o Haiti este considerado o país mais pobre do mundo. "Os
Escravos são sempre inimigos naturais de seus senhores: eles são contidos pela força e
Pela violência", afirmava José Antônio Miranda autor de um panfleto que circulou no Rio
De Janeiro em 1821 com análise da situação política do Brasil e de Portugal. "Em toda
Parte onde os brancos são muito menos que os escravos e onde há muitas castas de
Homens, uma desmembração [...] pode estar ligada com a sentença de morte e um
Batismo de sangue para os brancos, como aconteceu em São Domingos e poderá
Acontecer em toda parte em que os escravos forem superiores em força e número aos
Homens livres."
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Viana era a favor da escravidão, mas achava que não pegava bem tê-la exposta
Publicamente numa cidade habitada por uma corte européia. Malvestidos, os negros
Costumavam se reunir nas ruas e praças aos domingos e feriados para jogar lutar
Capoeira e batucar. Quando cometiam algum delito, seus donos tinham a prerrogativa de
Mandar açoitá-los em praça pública. Relatório do intendente em 1821 revela que um
Terço de todas as prisões de escravos no período estavam relacionadas a "crimes contra
A ordem pública", registrados nos boletins policiais sob o nome genérico de "desordens".
Nessa categoria incluíam-se brigas, bebedeiras, jogos proibidos - como capoeira - e
Agressões físicas. Pequenos furtos e porte de armas, como navalhas, eram reprimidos de
Forma severa.
Um escravo recebia de duzentos a trezentos açoites por ser encontrado com
Navalhas ou lutando capoeira. "A capoeira era um símbolo de cultura africana, ostentado
Orgulhosamente pelos escravos nas ruas do Rio de Janeiro", relata a historiadora Leila
Mezan Algranti.
Era também um meio de defesa, temido pelas patrulhas policiais que rondavam a
Cidade. Os negros poderiam ser presos apenas por assoviarem o ritmo da capoeira ou
Por usarem casquete com fitas amarelas e encarnadas - símbolo dos lutadores de
Capoeiras - ou ainda por carregarem instrumentos musicais utilizados nesses encontros.
Registro policial de 15 de abril de 1818 revela que "José Rebolo, escravo de Alexandre
Pinheiro foi preso por usar um boné com fitas amarelas e vermelhas". Tinha em seu
Poder uma faca de ponta. A punição: trezentos açoites e três meses de prisão.
Nada disso, na opinião de Viana, era condizente com o novo patamar de
Elegância e refinamento que o Rio de Janeiro deveria ostentar com a chegada da família
Real. Segundo o intendente, numa cidade que abrigava uma corte, açoitar negros em
praça pública era "verdadeiramente indecente". Além do mais, poderia provocar
Desnecessárias revoltas. Por isso, suas medidas incluíram a proibição de reunião de
Negros escravos em lugares públicos. Os açoitamentos continuaram a ser feitos, mas em
Recintos fechados, sob a supervisão da intendência geral de polícia, longe dos olhos nobres e estrangeiros que circulavam pelas ruas.

Este capitulo retrata a historia violenta do Rio de Janeiro em 1808 quando a corte portuguesa veio para o Brasil, fugido de Napoleão Bonaparte.
Um belo trabalho de pesquisa que merece ser lido.